Welcome footsteps, de Sir Lawrence Alma Tadema |
Maria acorda muito cedo. Gestos lentos traduzem sua imensa falta de
vontade para levantar. Encaminha-se para o banheiro. Antes coloca um CD com a 5ª
Sinfonia de Beethoven. Espera que aquelas notas barulhentas e vibrantes
consigam produzir-lhe uma reação interna, ainda que seja de irritação. O que
ela não quer mais é continuar naquela apatia. A água fria do chuveiro faz com
que a sua pele se retraia e Maria aproveita a sensação para se tocar inteira,
despertar cada célula adormecida, reavivar cada sentido. Ela não quer esquecer
que tem corpo, que tem sexo, que ainda é capaz de vibrar. Maria toma seu banho
sem reprimir sentimentos ou pensamentos, mas sente-se confusa. Só então percebe
que é sexta-feira e tem um encontro marcado.
Apronta-se com leveza, cabelos molhados, roupa indiana,
larga, dessas que não marcam as formas, sem maquiagem, sandalinha rasteira de
couro cru, relembrando o visual hippie que durante anos fez parte de sua vida.
João é como ela gosta. Másculo, mas com suavidade no olhar, nas palavras, no
jeito de tratá-la, nos sentimentos. É firme e terno. Sem olhar para trás, Maria se lança ao novo
dia, a se preparar internamente para esse encontro.
“E o tempo que levou uma rosa indecisa
a tirar sua cor dessas chamas extintas
era o tempo mais justo. Era tempo de terra.
Onde não há jardim, as flores nascem de um
secreto investimento em formas improváveis”.
(Drummond)
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