sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Apenas moinhos de vento

Maria se emociona ao ver aquela paisagem pela primeira vez. Tudo lhe parece familiar, afinal passara parte de sua vida tendo a fantasia como ferramenta de trabalho e, naquele instante, o que lhe vem à mente é o mito quixotesco que permeou sua literatura. Lutou sim com enormes e cruéis gigantes que, ao final, se transformaram em moinhos de vento, só mesmo para lhe roubar a glória da vitória. E como Quixote, sua luta sempre foi solitária. Arremessou-se sozinha contra todos. Ganhou batalhas em números idênticos às que foi derrotada. Tornou-se mestra em oximoros, em aproximar sentimentos antagônicos, em rir da dor e chorar de alegria. Apostou suas fichas na vizinhança do impossível. Mas viu moinhos se transformarem em gigantes e era isso o que importava. 
Se a luta contra moinhos de ventos é o paradigma da luta inútil, Maria, finalmente, encontrava seu caminho e assumia sua fantasia. Qual era sua alucinação naquele momento? O medo de viver ou de morrer? Entendia profundamente a ficção e a realidade, mas a ela não importava a inutilidade, desde que a entendesse como necessária para seu desejo e, portanto, necessária para o mundo. De suas fantasias alicerçou a ponte para a realidade e pavimentou a realidade com fantasia. A vida lhe pareceu mais suportável. Naquele momento Maria não apenas realizava uma de suas inúmeras viagens imaginárias e fantásticas,  também pincelava de realidade o que um dia não passou de alucinação. 



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