quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Idílio

Idylle, de Willian Bouguereau
Não era um bom dia para fazer a faxina, o calor estava insuportável, a vontade de voltar para a roça, e descansar em uma sombra para sentir o vento no rosto, ficava cada vez mais forte. Ainda assim Maria se levanta, respira fundo, e parte para mais um dia de trabalho. Enquanto jogava água na janela ela aproveitava para se refrescar nos respingos e organizar seus pensamentos. Bailam na lembrança cenas do campo, dos encontros furtivos com João, da alegria da juventude, da irresponsabilidade do amanhã. Tinha os olhos fechados e os movimentos da faxina acompanhavam o ritmo preguiçoso das lembrança. Era como se ele a olhasse. No limite do prazer e da posse, um homem olha para uma mulher como se meditasse sobre o princípio da vida. Queria tê-la em sua consciência sem importuná-la em seu sonho. Ela dormitava, passando lentamente a flanela sobre a mesa de vidro. Também ela, em toda sua simplicidade, precisava se acertar com o tempo. A interioridade sexual era tão intensa, os corpos tão ausentes, que a sensação de serem tocados parecia uma oferta divina duma imaginação profundamente amorosa. Havia muito mais vida no passado, ela sabia, mas precisava viver o presente. De repente, o celular toca e tira Maria de suas reflexões. João é apenas uma lembrança que se desvanece.

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