Aphrodite and Eros, Henri Camille Danger |
A noite foi longa e fria. Maria acorda com o corpo dolorido, a cabeça como se estivesse no vácuo, o coração apertado. Espreguiça com vontade e faz alongamento
ainda na cama, para enfrentar mais um dia sem graça, isolada em sua enorme
sala, tendo por companhia apenas uma tela de computador. Tem lá suas vantagens:
pode ler, ouvir música e escrever. Mas está dividida.Deixa para trás outros
aspectos da vida que reclamam sua atenção. Hoje, especialmente hoje, ela sabe que precisa separar um tempo para si, para resolver essa questão interna da
divisão. Lembra-se de quando tinha seus filhos pequenos e precisava deixá-los
para ir à luta pela sobrevivência. Hora de retribuir o que a vida lhe
presenteou.
Em meio à tempestade de areia no deserto, um pequeno oásis.
Não saber o que acontece por dentro é andar na escuridão e passos indecisos
nunca são capazes de levar ao ponto certo. Ainda assim, Maria se sente
estranhamente feliz, com todo aperto no peito, com a voz saindo mais trêmula do
que nunca, engasgando quando verdades profundas vem à tona. Encontra, depois de
muito tempo, um João, enigmaticamente de olhar tristonho e sorriso risonho, que
um dia esteve povoando os sonhos e fantasias de um mundo virtual. João é como a
águia que hipnotiza a presa. João é como o rouxinol, seus gorjeios enchem o
coração de Maria. João é como o santo, acende a fogueira do coração de Maria.
Quer viver. Não quer trazer João para a realidade, não quer distribuí-lo na
igualdade de seus dias. Nem tempo, nem espaço, nem qualquer preconceito, limitariam
a doce Maria cansada de solidão.
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