domingo, 27 de abril de 2014

Guia coração!


Divining Heart, de Michael Whelan

Muitas vezes me senti perdida. Se não ficar atenta, eu me perco de mim todos os dias. Lamentavelmente não existem regras, mas há, sim, métodos simples que podem disciplinar nossa mente. Um deles é não ter medo de enfrentar a si próprio, reconhecer seus defeitos, admitir que todos nós temos sombras, mas só podemos combatê-las se as identificarmos. Penetrar nossos labirintos pode ser uma experiência gratificante e pode nos ensinar os primeiros passos em direção à Luz que vem de dentro. Podemos identificar esse ponto brilhante nas sístoles e diástoles de nosso pensamento.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Histórias Prá Boi Dormir

Witches Sabbath, de Francisco Goya
Noite de lua cheia. No pequeno vilarejo de Rancho Fundo, onde a luz elétrica ainda não chegou, os mais velhos se reúnem em frente ao largo da capela para contar histórias. Faz um pouco de frio e a fogueira tem então duas funções: aquece e assa batatas doces, banana da terra e milhoverde. É uma noite comum e as crianças, que se aproximam alvoroçadas, logo encontram um lugar perto da fogueira onde ficam caladas esperando pelos casos verídicos. Daqueles que os contadores juram ter visto "com os olhos que a terra há de comer".

Um pouco isolada da maioria, Maria presta atenção em cada palavra. Rita é a primeira a contar um fato que marcou sua vida para sempre. Sua primeira filha evidencia alguns traços de deficiência mental e ela explica como foi que a criança ficou doente.

- Estava dando "mamá" para ela, recém-nascida, quando uma cobra que estava escondida entre os caibros, desceu e começou a mamar no outro peito. Eu nunca acreditei que existisse aquele tipo de cobra, que se sentia atraída pelo cheiro de leite. Mas ainda bem que mamãe tinha avisado que quando isso acontece a gente não pode se mexer, senão a cobra mata a mãe envenenada e a criança enforcada. Fiquei quietinha, mas a criança ficou assim, doente.

- Cruz credo!
- Virgem Maria!
- Que coisa horrorosa, exclamavam as crianças com os olhares arregalados.

Mal Rita termina a sua história, Benedita comenta:

- Ah! Isso não é nada! Vocês sabem o que aconteceu comigo há uns tempos atrás? Naquela época que eu era incrédula e curiosa? Pois eu vou contar:

 - Conta! Conta!, pediam os meninos.

 - Toda noite, quando eu ia me deitar eu ouvia uma pessoa passar gritando "Ai meu fígado, meu fígado, meu fígado. Ai meu fígado, meu fígado, meu fígado". Um dia resolvi levantar para ver quem era e me deparei com um monstro horrível, ensangüentado, que procurava o caçador que o havia atingido no fígado.

- Essa é pequena perto da minha, comenta Tia Marica.

- Um dia estava na janela, era uma noite de lua cheia como hoje e eu não queria dormir porque fazia calor. Quando deu meia noite vi um grupo de pessoas se aproximando e percebi que era uma procissão. Achei estranho, não conhecia ninguém. Elas traziam uma vela acesa na mão e a última pessoa da fila me entregou a vela e disse que voltaria no dia seguinte, no mesmo horário,  para buscar e que eu não podia deixar apagar. No dia seguinte, quando eu acordei, no lugar da vela estava um osso humano e eu fiquei pra morrer de medo, principalmente porque tinha que entregar o osso naquela noite. Sem alternativa,  fui para a janela de novo à meia noite. Veio a procissão e a mulher parou na minha janela e pediu a vela.Nessa hora apareceu uma caveira que veio correndo  em minha direção sem um pedaço do braço gritando "Quero meu braço, quero meu braço". Entreguei o osso rapidamente e tentei fechar a janela, mas a mulher me impediu. Está vendo? Isso é para você deixar de ser curiosa,  ir dormir cedo e nunca mais atrapalhar a procissão dos mortos.

- Entendi, retruca imediatamente Maria, vocês pensam que botando medo na gente, nós vamos dormir cedo? Podem contar mais histórias pra boi dormir, porque aqui ninguém tem medo de fantasmas.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Céu de Abril

Imagem: "Hip Hip Hurra!" - Peder Severin Kroyer


As manhãs de abril são realmente as mais lindas, pelo menos nesta região do país. Céu azul, sol brilhante e uma brisa suave para comemorar o dia do nascimento do meu sobrinho Alexandre. Olha só, nasceu no mesmo dia do tio Tote (padrinho do pai dele) e de nossa cidade natal: Cuiabá. Um mestre por vocação, um filósofo por natureza, então, sem ter o que reivindicar, agradeço pela sua vida e pelo privilégio de fazer parte dela. Desejo que cada ação que o mobiliza seja sempre para concretizar o ideal sonhado, edificar e solidificar. É... o tempo assume outras dimensões... Feliz Aniversário Alexandre!

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Romance de Outono

Romance of Autumn, de  George Bellows


Outono
Alice Capel

O outono chegou com seus matizes coloridos,
pintando o universo com o mágico pincel
da natureza.
As cores resplandecem na imensidão,
e um mundo de vibrações coloridas
invadem toda a natureza.
O Sol se tornou mais poderoso ao penetrar em Áries.
As plantas se revestem com novas forças,
e as borboletas brincam com as flores do jardim.
O beija-flor, de vez em quando, se cruza
com a frágil borboletinha, num encontro formal e respeitoso.
Todas as estações têm seus encantos.
Porém, o outono, para mim é especial.
Será que minha afinidade com o outono é
porque tenho uma alma velha?
Ou, porque nasci no outono?
Não sei. O que sinto, nesta estação, é um desejo
enorme de que todas as pessoas sintam,
como eu, felizes, com forças renovadas.
Com o coração aberto para receber o novo sol
que brilha mais intenso no meu coração,
e no amor que me renova.

Recolhimento, de Alice Capel

O dia hoje é em homenagem à querida Tia Alice. 
Este foi um dos últimos poemas que ela escreveu.

John Atkinson Grimshaw - Dame Autumn hath a Mournful Face

Recolhimento

Vou me recolher no Santuário
do meu Templo Interior
e me embalar nos braços
da solidão Cósmica.

Aquecer meu coração
na luz do sol
e entregar-me à maciez
das espumas do infinito.
Sinto o frio dos desabrigados,
a indiferença
dos que se distanciam de minhas recordações.
No Santuário do meu Ser
vou viver as emoções
dos que ficaram ancorados
em meu coração.
Reviver os meus antigos
e intensos instantes...
na música...
na poesia...
nos sonhos...
e esculpir
a imagem mais forte
que há em mim.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Noite de outono

 Leonid Afremov
Chove
Entre estranhos sons
Sinto-me estrangeira
Distante de mim mesma
Na chuva
Um ponto de contato
O gotejar familiar
A sinfonia de milhares de gotas
Trovões.
Perco o sono
Um estranho renascer
Pingos num bailado brilhante
Vida
Movimento
Som
Reflexão
Uma trilha interna conhecida
A hostilidade contida.
Encho os pulmões de ar
Dói
Como um caramujo
Recolho-me à minha casca.