The Seat of
Justice in the Parliament of Paris in 1723, de Nicolas Lancret (1690-1743)
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O impeachment é desagradável, apenas desagradável, porque
não resolve absolutamente nada como tentarei mostrar a seguir:
1 - trata-se de retirar uma Presidenta legitimamente eleita
com 54 milhões de votos;
2 - não há crime de responsabilidade, revelando que a
tentativa de retirada da Chefe do Executivo, embora violenta, demonstra, em vez
de amadurecimento institucional, infantilidade das instituições, não passando
mesmo de "nova perspectiva de poder", vale dizer, o que muda são
apenas os detentores do poder direto, alijado o povo do processo, aliás como
sempre foi, conquanto agora haja muitos problemas com tal conduta, pois o povo
está se politizando e vendo de onde vem a gangrena;
3 - sobre o crime de responsabilidade, é bom notar que:
3.1 - a abertura de créditos suplementares, utilizada
amplamente pelos chefes do executivo, foi convalidada pelo Congresso, que,
evidentemente, assumiu a responsabilidade por eles;
3.2 - as pedaladas fiscais também não o constituem, já que
contratos de mútuo (empréstimos) não se confundem com pagamentos em atraso.
4 - estes são os elementos da denúncia a que o Senado está
adstrito, como um órgão responsável pela análise técnica dos fatos. Por óbvio,
não vem ao caso a manutenção de um governo corrupto e inerte;
5 - com relação ao governo corrupto, por informação do
Congresso em Foco
(http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/veja-a-lista-dos-parlamentares-que-sao-reus-no-stf/),
há 175 políticos que são réus no STF: 40 do PMDB, 26 do DEM, 23 do PSDB, 22 do
PP, 21 do PR... 11 do PT. O nome da Dilma não consta da lista da Odebrecht e
não há um único ato pessoal dela que a faça, pelo menos, ser investigada. Os
mensaleiros do PT têm seu correspondente no PSDB e no DEM, embora os grandes
meios de comunicação silenciem sobre os dois últimos. Enquanto a VEJA fez 12
matérias de capa para o mensalão do PT, não fez nenhuma sobre o mensalão do
PSDB ou do DEM. Dilma também não faz parte da lista de Furnas, enfim, é uma
pessoa honesta e não se confunde com o PT, naturalmente.
6 - a inércia do governo é argumento fraquíssimo, pois após
2014 o legislativo simplesmente não a deixou fazer nada e agora diz que ela é
inerte. Essa carapuça serve ao legislativo;
7 - sobre o aspecto econômico, sabemos que se trata apenas
de engodo porque, em economia, quando alguém perde, alguém ganha. E basta
mostrar sempre do lado que perde para influenciar o povo leigo negativamente, o
que demonstra também falta de argumentos;
8 - os grandes meios de comunicação criaram uma polarização
no povo que evidentemente não se esgotará com o impeachment. Será que alguém
acha que, havendo o impedimento, a esquerda silenciará? Ou, não havendo, a
direita modificará e passará a colaborar? Claro que não! Os polos se manterão
até 2018, quando as novas eleições, sem financiamento privado, deverão trazer
um novo Congresso com menos corruptos. Se não houver sido criada uma
superioridade suficiente de um dos lados, o problema se estenderá até 2022 ou
mais;
9 - na realidade, a manutenção da Presidenta deve-se
sobretudo à preservação da democracia, ao respeito à Constituição, aos poderes
constituídos. Mesmo após tais constatações, caso se opte pelo impeachment, os
atuais poderes da República entrarão para a História pelo pior lado. Hoje,
diversamente do passado, se entra para a História mesmo, pois os fatos ficam
registrados e acessíveis a todo mundo no futuro. Não dá para mentir ou fazer de
conta que algo não aconteceu. A descendência toda dos participantes ficará
sabendo como tudo ocorreu;
10 - os complicadores atuais são, em primeiro lugar, a
internet seguida de perto pelo crescimento da população;
10.1 - a internet está liquidando o discurso único na mídia,
que, atualmente, só influencia os idosos que não se interessam pela rede e
assistem sempre aos mesmos canais. Nas redes há um fantástico direito de
reunião com troca de ideias e grande enriquecimento mental da população;
10.2 - sobre o crescimento populacional, observe-se que, faz
uns 50 anos, era comum a existência de delegados, juízes, fiscais... chamados
de "calça curta", isto é, ingressavam nas carreiras sem concurso
público, apenas se valendo de suas relações com o poder. Com a paulatina
migração deste para a maioria do povo, os bastiões dos privilégios tendem a
desaparecer e os filhos das "elites" ou se preparam ou vão passar
maus bocados. As aspas se devem ao fato de que grande parcela da classe média
sofre de um complexo de inferioridade, que as faz morar no "Green House",
no "Quartier Latin", na Piazza qualquer coisa, que as faz dizer que
têm um "look" bonito, ou que vai fazer um "delivery", ou
lembrar-se da "Black Friday", ou alimentar-se nos "Food
Trucks"... Como ela se despersonaliza e se sente sem valor algum, precisa
do carrão, da casona... para tampar sua insignificância. Nem deveria ser
chamada de elite e, por isto, as aspas;
11 - o impeachment é a pá de cal nesse pessoal, pois,
queiram ou não, até 2018 terão que mostrar sua bela cara feia. O voto
restaurará uma parte da sociedade. (Por Jardel Luís Costa Leite)