Imagem: Kagaya
Hoje tirei o preto do meu template. Busco dentro de mim novas motivações para continuar vivendo e, mais uma vez, descubro que escrever ainda é minha grande paixão. Voltar às histórias de Maria, brincar com o pensamento e a propriedade deles, distinguir um trabalho do outro. Não é uma tarefa fácil para mim que tenho a transparência como escudo. Mas a palavra, ah... ela pode adquirir novos contornos, ter significados diferentes, mesmo que sejam as mesmas. Talvez pelo olhar de quem faz a leitura.
Estou retornando. Devagar. Sofrida com os sucessivos choques de 2011. Se forem confirmadas as profecias maias, 2012 não me reserva mais surpresas. Perdas já fazem parte da minha vida e já perdi a conta de quantas vezes tive que reiniciar. Agora, nesta fase, sinto-me um pouco perdida. Não consigo pensar em projetos a longos prazos. É como se fosse uma defesa, nada querer, nada desejar, nada planejar. Deixar a vida acontecer e o vento me levar para onde soprar. Não estou deprimida, apenas vazia. Contemplativa, para ser mais poética. Imaginei, após o impacto da doença, que seria a mulher mais serena do mundo, que não me preocuparia com mais nada e que promoveria uma mudança radical na minha vida. Como se isso fosse possível. Nunca me senti tão cobrada. Tenho que conversar, quando o que mais desejo é me recolher à minha interioridade. Tenho que sorrir, mesmo se meu coração sangrar. Afinal, sempre fui uma mulher forte e agora sou obrigada a manter a fama.
O mais estranho é que apesar de me cobrarem fortaleza, alegria, as atitudes de muitos mudaram. Tratam-me como ... doente? Todo mundo sabe mais a meu respeito que eu mesma, todos sabem decidir como devo programar a minha vida, o que me falta, o que tenho em excesso, o que devo comer, que médico é melhor pra mim. Qualquer reação de minha parte e logo recebo um rótulo. Sempre procurei ver o mundo partindo das minhas próprias percepções. O que mudou agora? Estou me vendo pelo olhar dos outros? Não tenho as respostas. Ainda. Mas sei que algumas pessoas conseguiram me magoar profundamente neste período pós-câncer. Pode ser que seja carência de minha parte, mas ninguém – salvo a família – está preocupado comigo. Acho que pela minha fragilidade física, alguns pensaram que podiam me falar o que quisessem, me julgar como bem entendessem, me definir como seus próprios reflexos. Em meus momentos de silêncio, aceitei. Achava que precisava ver o mundo com ternura, com compreensão, mas não deixamos de ser quem somos porque temos um câncer, e meu espírito não tem essa passividade dos iogues. Comecei a reagir e, às vezes, até com agressividade. Precisava proteger meu Ser, meu Sanctum, minha integridade. Cultivo princípios e valores que não são fáceis de carregar, mas não uso máscaras. Então, não me cutuque, porque agora, principalmente agora, não tenho mais que engolir disparates. Não me julgue, se não quiser ouvir o meu julgamento a seu respeito, não me trate como doente, se não quiser ver sua projeção em mim. Não morri! Só peço que respeitem os meus momentos de silêncio. Vivo meu período de transição e estou em busca de outras compreensões. Um tempo de pausas e meditação. Um tempo em que preciso girar o foco e voltar para dentro, para minha intimidade. Um ponto em que preciso entender o passado sem saber se há futuro, aliás, passado e futuro tem o mesmo significado de presente. Um tempo que desafia a arrogância intelectual e me proporciona reflexões, acolhimento e a sensação de uma solidão que é amiga. É quando posso chorar as perdas, as mágoas, o desengano, mas que aprendo a contar os dias com o coração mais sábio.
Palavras podem tentar quebrar o isolamento e ecoar no silêncio, no vazio, em algum ponto do caminho. Um silêncio de atitudes que poderia ser preenchido com palavras, fecha-se entre o silêncio e a solidão.